terça-feira, 14 de agosto de 2012

Qual a sua tarefa histórica?

Nada mais poderoso que a força de uma ideia cujo tempo chegou

por Sandra Helena de Souza

No último dia 2, o secretário Nacional de Justiça, presidente da Comissão Nacional de Anistia do Ministério da Justiça, Paulo Abrão, ministrou aula inaugural do semestre letivo do Centro de Ciências Jurídicas na Universidade de Fortaleza (Unifor), evento que constou da programação oficial da 60ª Caravana da Anistia que visitou Fortaleza pela segunda vez.

Para uma plateia numerosa de estudantes e ‘operadores’ do Direito, propôs um desafio à juventude: “qual a tarefa histórica que o tempo atual lhes delega?” Para ele, dentro do bom e velho espírito iluminista, nada há de mais reprovável que uma geração que desconhece as tarefas que a história lhe reservou, pois ela queda aquém de suas possibilidades e retarda um processo que só depende dela mesma.

Se a geração da primeira hora da Anistia exigiu o retorno das liberdades civis e a segunda a reparação material e moral dos vitimados e perseguidos pelo Estado de Exceção, agora se exige o aprofundamento institucional da democracia, já desenhado a partir do marco jurídico instaurado pela Lei de Acesso à Informação e pela Comissão da Verdade e Memória. E acrescento: tal radicalização não poderá se dar sem que enfrentemos sem mais postergações o delicado tema da segurança pública aí incluída a refundação do modelo de nossas polícias.

Em agosto de 2009, delegada pela sociedade civil, participei da I Conseg. Por isso, à convite da Associação de Cabos e Soldados do Ceará, no último dia 3, estive em audiência pública no Ministério da Justiça em Brasília sobre a desmilitarização das polícias. Uma dessas coincidências que faz lembrar a famosa frase: nada mais poderoso que a força de uma ideia cujo tempo chegou.

A recente onda de greves das polícias militares, a situação insustentável do extermínio de pobres das periferias de São Paulo, denunciado por integrantes da tropa, que fez surgir o movimento das Mães de Maio, e que também vitimiza policiais, a excrescência dos “autos-de-resistência”, expediente legal do período da ditadura para mascarar assassinatos dos opositores, os índices alarmantes de homicídios e execuções extra-judiciais Brasil afora, os “erros” de abordagem denunciados por câmeras indiscretas, que vitimaram o publicitário paulista, e o jovem Bruce, há dois anos, e agora Bruno de 22 anos, ambos em Fortaleza, na área nobre, mortos pela “nova” polícia do Ronda, com tiros na nuca, são sinais que gritam. Falta disposição das forças progressistas da sociedade de apropriarmo-nos de modo consequente de um tema que ainda é pautado predominantemente pelas forças do atraso.

Arrisco-me a repetir o que disse em Brasília à plateia de jovens policiais subalternos: eles já estão tomando consciência de sua tarefa ainda que corporativamente. É necessário que estejamos, os de fora, atentos e fortes, para consolidar o caminho que viemos trilhando desde 1979. É ‘apenas’ de História que se trata. E de estarmos ou não à altura de nosso tempo. Nada mais.

Sandra Helena de Souza é professora de Filosofia e Ética da Unifor

5 comentários:

  1. O que retarda esse processo do jovem polícial ser um profissional correto são casos como o do assassinato da juíza Patrícia Acioli, morta com 11 tiros há exatamente um ano no RJ. Certamente sua execução foi motivada por sua postura inflexível diante das milícias e da criminalidade policial, sendo assim, o policial, o bom policial, que não concorda com essa prática de limpeza dos que incomodam o status quo dos quarteis tem medo de também ser assassinado e cala-se.

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  2. É, tudo parecia sob controle quando estavam matando alucinadamente na periferia, afinal isso não dá manchete. Pobre morto não vira assunto nem em mesa de bar. Mas quando a polícia se utiliza da mesma prática em pessoas da classe média, pronto, todo mundo fala que agora é preciso tomar consciência porque o descontrole dessa polícia que mata, porque matar é uma política de Estado, veio a tona. A hora de mudar já está mais que atrasada então resta acertar os ponteiros, acreditar e agir para que seja agora.

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  3. É isso aí. Que seja dada a largada para por um fim a tanta morte de pessoas que nem sabem porque estão morrendo e para as que sabem mas que jamais jamais mereciam ser executadas, na verdade ninguém merece.

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  4. muito bom o artigo!!! li recentemente algo na mesma linha num livro usado que comprei pelo http://www.adquo.com.br/ Valeu dmais!

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  5. Tbm gostei e me fez pensar mto nessa idéia : "nada há de mais reprovável que uma geração que desconhece as tarefas que a história lhe reservou, pois ela queda aquém de suas possibilidades e retarda um processo que só depende dela mesma" - Vou me utilizar dessa idéia na minha propria vida e tentar repassa lá aos q estão ao meu redor.

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