quinta-feira, 3 de março de 2011

Aliança com a direita impede avanço nos direitos humanos

por Lúcia Rodrigues

Acordo com empresários que financiaram ditadura é uma das principais causas do entrave.

O Brasil é o país mais atrasado do Cone Sul quando o assunto é direitos humanos. Enquanto Argentina, Chile e Uruguai já condenaram centenas de agentes do Estado que perseguiram, sequestraram, torturaram e assassinaram milhares de ativistas de esquerda durante os anos de chumbo, aqui nenhum repressor sentou no banco dos réus.

O máximo que se conseguiu até agora foi uma sentença da Justiça paulista reconhecendo publicamente o ex-comandante do DOI-Codi de São Paulo, Carlos Alberto Brilhante Ustra, como torturador. A sentença, no entanto, é apenas declaratória, não tem desdobramento penal. E ele continua solto.

A diferença na condução das questões ligadas aos direitos humanos pelo Brasil e por seus vizinhos é abissal. Na Argentina, por exemplo, já ocorreram mais de 700 julgamentos de militares com condenações, inclusive, à prisão perpétua. Mas qual seria o motivo de tanta benevolência por parte do Estado brasileiro para com seus criminosos de farda? A chave para o enigma deve ser procurada no baú de empresários que financiaram o golpe e sustentaram a ditadura durante mais de duas décadas.

Praticamente todas as empresas envolvidas com a repressão continuam atuando no mercado. Agora não mais financiando os fios elétricos que descarregavam voltagem no corpo dos “subversivos” nos anos 60 e 70. Os tempos são outros. Uma demão de verniz conferiu a um passado sombrio o brilho da plasticidade democrática. Esses empresários continuam doando polpudas quantias, mas agora na forma de contribuição declarada ou de recursos não contabilizados, como é conhecido popularmente o famoso caixa dois das campanhas eleitorais.

Paralelamente à atividade econômica que continuaram desenvolvendo, se converteram nos grandes timoneiros do rumo político do país. Como se sabe generosidade tem limites. E apoio é via de mão dupla: pressupõe contrapartida. Lógico supor, então, que uma das imposições a seus financiados é para que estes impeçam qualquer possibilidade de envolvimento de seus nomes e da suas empresas em escândalos dessa magnitude.

Não é difícil imaginar o desgaste, que uma revelação dessa envergadura, provocaria na imagem de seus produtos. “Fica difícil justificar. A Folha perdeu leitores quando falou em ditabranda. Quando os empresários dão dinheiro (para campanhas políticas), estão dizendo: ‘limpa minha barra, senão não dou mais’. A lógica da rede de cumplicidade é essa. É um cala boca”, ressalta Ivan Seixas, representante do Fórum de Ex-Presos Políticos. “A ditadura montou essa rede de cumplicidade quando montou a caixinha para a repressão”, frisa. "Empresas deram grana. Se o torturador Ustra sentar no banco dos réus vai alegar que, além de cumprir ordens, foi financiado por empresários”, destaca o ex-preso político.

(matéria publicada originalmente na revista Caros Amigos)

8 comentários:

  1. Os artigos de Lúcia Rodrigues são sempre imaculáveis. Mas nesse ela surpreendeu até a mim, um cético.
    A verdade é essa: A muitos não interessa a verdade.

    ResponderExcluir
  2. Fios elétricos, verniz, plasticidade.
    Juro que vou fazer uma pesquisa para desvendar essa charada.

    ResponderExcluir
  3. Bom, muito bom, sinto cheiro de coisa boa no ar que Lúcia espalhou.

    Marcela, vc tá em todas!! hehehe... Qual o seu signo?

    ResponderExcluir
  4. Desculpem-me pela falta, Lúcia e Arlequins. Porque nenhum artigo se propaga se não houver quem aperte o acionar do spray. hehe

    ResponderExcluir
  5. Aliança com a direita perigo constante.

    ResponderExcluir
  6. É... Isso tem um cheiro bastante desagradável e vem de longe, muito longe. Enquanto houver quem compra haverá quem venda. E o preço a gente que paga.

    ResponderExcluir
  7. O poder é construído de jogos e falcatruas onde prevalece a vontade do que tem o maior cacife.
    Claro que a verdade nunca virá à tona enquanto os donos da mesa estiverem batendo seus martelos.
    Ustra e todos os torturadores serão sempre livres. E a nossa história numa eterna prisão pérpetua.

    ResponderExcluir
  8. Será que a palavra NOJO é nojenta demais para adjetivar esse assunto?

    ResponderExcluir