quarta-feira, 2 de março de 2011

Ustra, o torturador que de nada sabia

Em sentença publicada em 9 de outubro de 2008, a 23ª Vara Cível de São Paulo, oficializou a condição de torturador do coronel reformado Carlos Alberto Brilhante Ustra.

Ustra comandou, de 1970 à 1974, o DOI-Codi de SP, órgão de repressão aos opositores da ditadura militar.

Nos seus seis anos de operações, o DOI-Codi prendeu mais de dois mil cidadãos por suspeitas de "subversão” ou “terrorismo”, e assassinou muitos deles. Entre eles os jornalistas Vladimir Herzog e Luiz Eduardo Merlino. Torturou e fez sangrar mulheres e homens, como um rapaz de 16 anos, Ivan Seixas, junto com o pai, Joaquim Alencar de Seixas, e fez em 16 de abril de 1971 Ivan presenciar o assassinato de seu pai. 502 denúncias de torturas já foram apresentadas. A atriz Bete Mendes, em 1985, o identificou como seu torturador.

A ação declaratória contra Ustra foi movida pelo casal Maria Amélia e César Teles, presos em 1972, pelos seus filhos Janaína e Édson e por Criméia, irmã de Maria Amélia. Janaína e Édson, então com 5 e 4 anos, foram levados de camburão ao DOI-Codi, como uma forma de tortura psicológica contra os pais e a tia.



Édson lembra

"Nas dependências deste então órgão público/estatal pude ver minha mãe e meu pai em tortura... Fui levado a um lugar onde, através de uma janelinha, a voz materna, que meus ouvidos estavam acostumados a escutar, me chamava. Porém, quando eu olhava, não podia reconhecer aquele rosto verde/arroxeado/ensangüentado pelas torturas que o oficial do Exército brasileiro, Carlos Alberto Brilhante Ustra, havia infligido à minha mãe. Era ela, mas eu não a reconhecia".

Defesa alega que ele nada sabia

Ustra comandava o órgão mas, segundo sua defesa, ele nada sabia das práticas cotidianas de tortura que ali aconteciam. Nada sabia, enquanto os presos, até mesmo quem passava pela rua ou morava próximo, sabia e reconhecia quando iniciava uma sessão de tortura, a dorida sonoridade de gritos de homens e mulheres, provavelmente recebendo choques elétricos, sob grotescos brados dos torturadores.

Ustra não poderia ignorar o que ali se passava

A sentença do juiz Gustavo Santini Teodoro assinala que o DOI-Codi era "uma casa dos horrores, razão pela qual o réu não poderia ignorar o que ali se passava". Segundo o depoimento das testemunhas, Ustra comandava as sessões de tortura com espancamento, choques elétricos e tortura psicológica. Os gritos e choros dos presos eram ouvidos até nas celas. Daí a conclusão do magistrado:

"Não é crível que os presos ouvissem os gritos dos torturados, mas não o réu. Se não o dolo, por condescendência criminosa, ficou caracterizada pelo menos a culpa, por omissão quanto à grave violação dos direitos humanos fundamentais dos autores".

Que o Exército tomasse seu lugar no banco dos réus

No processo em que foi condenado, Ustra fugiu à responsabilidade por seus atos transferindo-a totalmente para sua corporação. Protocolou uma contestação onde assegurava que "agiu como representante do Exército, no soberano exercício da segurança nacional". Assim, sugeria formalmente que o Exército tomasse seu lugar no banco dos réus.

"O Exército brasileiro é uma pessoa jurídica, sendo que, pelos atos ilícitos, inclusive os atos causadores de dano moral, praticados por agentes de pessoas de direito público, respondem estas pessoas jurídicas e não o agente contra o qual têm elas direito regressivo... Todas as vezes que um oficial do Exército brasileiro agir no exercício de sua funções, estará atraindo a responsabilidade do Estado".

Solidariedade a Ustra

Mesmo apontando o Exército como responsável, centenas de oficiais, a maioria da reserva, se reuniram num almoço na Galeteria Gaúcha em Brasília, em solidariedade ao coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra.




Trecho do discurso de agradecimento de Ustra


“Enquanto assaltantes, sequestradores, terroristas, e assassinos permanecem livres sob a justificativa de que ‘lutavam pela causa’ nós que cumprindo ordens de nossos superiores hierárquicos lutamos e preservamos a democracia, agora estamos ameaçados de ir para a prisão por aqueles que combatemos, e que para isso não terão o menor prurido em mudar a lei. Quando, com pesar assisto tudo isso, só me vem à mente a frase que me acompanha desde o início da minha vida militar, pronunciada pelo Tenente de Artilharia Antônio de Siqueira Campos, um dos 18 do Forte, e considerado a maior expressão da história do Movimento Tenentista: ´A Pátria tudo se deve dar e nada pedir, nem mesmo compreensão`”.

Trecho do discurso do ex-senador Jarbas passarinho

"... O senhor está pagando o preço de ver-se vítima do rancor dos vencidos, mas como usamos dizer em tática, da ação judicial tardia há uma missão deduzida. Revanchistas, ao que visam – depois de receberem do governo indenizações vultosas, para compensar a derrota na luta armada que desencadearam – e imitar revanchistas vizinhos, que revogaram a lei da anistia e da obediência devida. Obediência que foi devida à defesa da Pátria, da liberdade de culto, de não ter medo nem ter fome, que os países comunistas remanescentes no mundo não respeitam.

Patriota, coronel Ustra, o senhor honrou o compromisso que jurou ao receber a espada de Oficial. Nunca a desembainhou sem razão e, depois de cumprir a missão, não a embainhou sem honra. Defendeu a Pátria que nos ensinou Ruy Barbosa 'não ser um sistema, nem uma seita, nem uma forma de governo. É o céu, o solo, o povo, a tradição, a consciência, o lar, o berço dos filhos e o túmulo dos antepassados, a comunhão da lei, da língua e da liberdade'.

Queira aceitar a nossa solidariedade, o reconhecimento de sua luta ingente contra a calúnia, ao repetir, neste século, a divisa empolgante da Cavalaria Medieval: Perca-se tudo, menos a honra”.

Outra definição sobre Ustra

"Causou-me surpresa ter notícia de que algumas pessoas que me pareciam dissociadas dos métodos de tortura lá estavam no regabofe, a homenagear e a solidarizar-se com o herói da tortura, coronel Ustra. Ele, na realidade, emporcalhou com o sangue de suas vítimas a farda que devera honrar". (José Carlos Dias, ex-ministro da Justiça e ex-secretário da Justiça de São Paulo)

fontes: Celso Lungaretti / Brasil de Fato / Portal Militar

7 comentários:

  1. Assassinos para muitos são heróis.
    Quando não são homens honrados.
    Visto o slogan de Passarinho: Perca-se tudo, menos a honra.
    Ustra não perdeu nada nem a honra.
    Não se pode perder aquilo que não se tem.

    ResponderExcluir
  2. "A Pátria tudo se deve dar e nada pedir, nem mesmo compreensão".
    Quack! Espero que essa temática não esteja em uso atualmente.
    Salete Eiras

    ResponderExcluir
  3. Ustra o carnificeiro que se traveste de plantador de alface porque vegetais não sangram vermelho quando cortados.
    Ai que dor! Falou certa vez um pé de alface. Mas ele não ouviu. Ele não ouve nada.

    ResponderExcluir
  4. Ustra, diferente de Tuma, não merece o título de o coveiro da ditadura, sim o de o surdo da ditadura.

    ResponderExcluir
  5. Hehe, isso aí Marcela...

    Mas, mesmo que ele não fosse surdo, ia dar em que o julgamento de Ustra, se ele foi um dos beneficiados pela Lei da Anistia de 1979, que beneficiou militares que tenham participado de sessões de tortura durante o período da ditadura. Bahhhhhhh!

    ResponderExcluir
  6. Sobre a foto que vcs postaram. Estive em PA nessa época, essas pichacões do Coletivo estavam por toda parte. Eles não perdem tempo, são muito atentos a tudo que acontece. Conversei com um dos membros, jovenzinho, e ele falou algo que nunca vou esquecer. "Não tenho tempo para esperar".

    ResponderExcluir
  7. E não vai sair disso.
    Ustra é o laranja.
    Exemplo do máximo que nosso judiciário pode fornecer aos executores.
    Brasil, gente, é muito, como direi, muito festivo. Pra que julgar a ditadura, ela foi tão brandinha.
    Horror.

    ResponderExcluir