Polícia X O Popular
Barra-pesada no jornalismo goiano
por Cileide Alves
Em 9 de janeiro o jornal O Popular, de Goiânia, iniciou a publicação da série de reportagens "Onde eles estão?", sobre pessoas desaparecidas em Goiás depois de abordagem da polícia. O jornal descobriu que a democracia tem mais desaparecidos no estado do que a ditadura: 29 pessoas sumiram entre 2000 e 2010 (dados atualizados) contra 15 goianos desaparecidos durante a ditadura militar. A manchete do jornal nesse dia foi impactante: "Democracia tem mais desaparecidos do que ditadura". Posteriormente, O Popular publicou outra série sobre suspeita de grupos extermínio na polícia e a revelação de que 117 pessoas foram mortas por policiais militares entre 2003 e 2005.
Em 14 de fevereiro, a Polícia Federal desencadeou a Operação Sexto Mandamento ("Não matarás", na tradução da Bíblia usada pelos evangélicos) e prendeu 19 PMs acusados de assassinato ou desaparecimento de pelo menos 40 pessoas em Goiás. A entrada da PF nas investigações ocorreu depois que um dos crimes atribuído ao grupo ter acontecido em Torixoréu (MT), fato que abriu a brecha jurídica para a entrada da PF na investigação de crimes de homicídios em Goiás.
Subcomandante da PM foi preso
A operação foi determinada pelo Ministério da Justiça e começou em abril de 2010. Um policial federal de Brasília foi destacado para Goiânia. Foram oito meses de escuta telefônica e de investigações que levaram à prisão do subcomandante da PM em Goiás, coronel Carlos César Macário, do tenente-coronel Ricardo Rocha, ex-comandante da Rotam (Rondas Ostensivas Táticas Metropolitanas) e de mais 17 colegas de farda.
Rocha foi candidato a deputado estadual em 2010 e foi gravado em conversas com ex-secretários da Fazenda e de Segurança Pública sobre doação de recursos para sua campanha e negociando promoção de colegas de farda pelo governo. O Popular revelou depois da operação que vários dos PMs presos foram promovidos no final daquele ano por "mérito".
Reação corporativa
A PF manteve os inquéritos em segredo de justiça. Na semana passada O Popular teve acesso a um deles e às escutas. As falas revelavam a banalização da violência e também que muitos dos PMs que já tinham sido presos em inquéritos da Polícia Civil pelos crimes em questão tinham privilégios na prisão no quartel. Por isso a PF havia pedido, e a Justiça autorizado, a transferência desses PMs para o presídio de segurança máxima em Campo Grande (MS). Isso tinha provocado a reação da corporação. O deputado estadual Major Araújo (PRB) iniciou um movimento de solidariedade em favor dos presos com adesão de todas as associações de militares e de seis ex-comandantes da PM. Os ex-comandantes publicaram nota na imprensa prestando solidariedade aos policiais presos.
Liderada pelo Major Araújo, uma comissão de quatro deputados estaduais visitou terça-feira (1/3) os presos em Campo Grande para checar as condições da prisão e como eles estavam sendo tratados. Descobriram que estavam em ótimas condições. Nesse clima, O Popular publicou quinta-feira (3/3) a reportagem "Mato por satisfação", com o dramático conteúdo das escutas. No mesmo dia ocorreu a ronda da Rotam ao prédio da Organização Jaime Câmara, onde fica o jornal (oito viaturas, com 30 homens, desfilaram diante do prédio com as sirenes ligadas; o Jornal Nacional noticiou no mesmo dia; veja aqui o vídeo).
Democracia ameaçada pelo medo
Essa ação da Rotam foi a parte visível de um processo de medo que existe nas instituições democráticas goianas. Juízes, promotores e até mesmo policiais federais trabalham nos inquéritos em sigilo, temendo represálias. Nenhum concede entrevista sobre o assunto. A reação do governo de Goiás ao destituir o comandante da Rotam, na mesma quinta-feira, foi uma tentativa de garantir a preservação das instituições democráticas, inclusive da liberdade da imprensa.
A PM goiana é uma instituição séria, com mais de 150 anos, e formada majoritariamente por policiais honestos e conscientes de seu papel de defesa da sociedade. O Popular tem respeito pela instituição e por seus membros. Mas é zeloso de seu papel de informar à sociedade sobre as ações dos agentes públicos, o que vem fazendo nesta série de coberturas. A ação isolada de cerca de 30 policiais da Rotam interpretada como tentativa de intimidação do jornal e de seus profissionais não vai desviar O Popular de sua missão de bem informar a população.
Para mim essa forma da PM agir como esquadrão da morte em tempos de democracia - atira primeiro, pergunta depois - é que nada foi feito para aprimorar a conduta dessa corporação. Continua lá sendo ensinado os mesmos métodos de abordagem ao pseudo-suspeito como nos tão velhos tempos da ditadura e de antes, muito antes.
ResponderExcluirSempre tive receio da polícia. Nunca a vi como defensora dos cidadãos - de seus direitos e deveres. É uma corporação preconceituosa e despreparada. E principamente nociva por sempre estar exercendo o papel de juiz declarando aos suspeitos uma pena que no Brasil não existe. A pena de morte.
ResponderExcluirSeria isto uma democracia branda? risos sem graça
ResponderExcluirQualé. A autora fala que a PM de Goias é formada por policiais conscientes de seu papel de defesa da sociedade. Opa, como pode ser quando um de seus agentes brada que mata por satisfação? Acho que não precisava desse happy end na matéria. Tava bom até aí.
ResponderExcluirEssa banalização da violência é filha da dita.
ResponderExcluirA banalização da violência é o mal pior que um estado pode ter, ela transforma policiais assassinos em defensores dos bons costumes, alegando que limpam a área ao matarem "bandidos" e quando matam inocentes não são punidos devidamente e a família amedrontada por estar lidando com os "homi" fica em silêncio.
ResponderExcluirA sociedade aceita essa banalização calada. Quem cala consente.
Como diz a música de Milton Nascimento "Quem cala morre contigo, mais morto que estas agora".
ResponderExcluirNada mudou por aqui. O que prevalece é o silêncio (como disse a Flora).
ResponderExcluirVivemos num mundo neurotizado onde a fonte da vida é um lamaçal de hipocrisia onde todos conseguem ao menos boiar.
É bom lembrar que todo Policial seja Militar ou Civil vem da sociedade que é a mesma da ditadura e da democracia o povo brasileiro tem os Políticos, as Leis e a policia que merece! Pois são eles que escolhem que seja assim! Dúvidas?
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